Lidar com disfagia na demência:  estratégias para cuidadores

25 de novembro de 2020

Dificuldade em engolir

Cerca de 45% das pessoas que vivem com Alzheimer podem perder a capacidade de se alimentarem à medida que a doença progride, de acordo com um artigo da Being Patient. O declínio das capacidades motoras, sensoriais e cognitivas pode conduzir a dificuldades na deglutição, também denominadas de disfagia.

A disfagia corresponde a uma dificuldade em engolir, implicando um maior esforço na condução dos alimentos sólidos ou líquidos desde a boca até ao estômago. Esta situação pode, por sua vez, originar problemas de saúde mais graves, como desidratação, desnutrição e mesmo pneumonia por aspiração.

Papel dos cuidadores

Os cuidadores de pessoas com demência desempenham um importante papel na identificação da disfagia, sendo essencial que consultem um médico e um terapeuta da fala para perceber quais as maneiras mais seguras de tratar a disfagia.

“Cuidar de uma pessoa com disfagia e demência é um desafio único e difícil”, como escreve Rinki Desai, Terapeuta da Fala do Centro Médico da Universidade do Mississipi, num artigo para a Fundação Nacional de Distúrbios de Deglutição. Mas, com o treino adequado, conhecimento e apoio profissional, os cuidadores podem melhorar a qualidade de vida da pessoa com demência.

Estratégias para lidar com disfagia em pessoas com demência

A Being Patient resume as seguintes estratégias para lidar com a disfagia, sugeridas por duas terapeutas da fala norte-americanas:

1. Ter atenção à postura

A postura pode ser um fator importante quando se trata de segurança e deglutição. Os cuidadores devem garantir que a pessoa com demência e disfagia fique numa posição confortável, de costas verticais durante as refeições. No final da refeição é aconselhável manter a pessoa em pé, por 30 minutos, para ajudar a digestão.

É de reforçar a importância de consultar um terapeuta da fala, de modo a evitar que os ajustes necessários não sejam realizados por iniciativa do cuidador, ou seja, sem orientação do profissional.

2. Reduzir as distrações na hora das refeições

Limitar o número de pessoas que estão à mesa com a pessoa com demência ajuda a manter o foco. No entanto, é importante garantir que o jantar continue a ser um momento agradável. Servir as refeições num ambiente confortável, usando apenas os utensílios básicos necessários é fundamental para evitar distrações ou até mesmo confundir.

Não esquecer que promover a autonomia durante as refeições é uma prioridade, exemplo disso é a abordagem conhecida como técnica mão-sob-mão, em que o cuidador coloca as mãos sob a mão da pessoa, para ajudar a levar os alimentos à boca.

3. Incentivar uma refeição mais lenta

Os cuidadores devem proporcionar um ambiente sereno à pessoa com demência para facilitar o “comer devagar”. Refeições menores e mais frequentes ou lanches ao longo do dia podem ajudar neste processo.

Para garantir a segurança na deglutição, é importante que todos os alimentos e líquidos sejam engolidos antes de voltar a ingerir novos alimentos e verificar que não existe acumulação dos mesmos na boca. Manter a higiene oral é crucial, pois é um dos principais fatores de risco de pneumonia por aspiração para pessoas com disfagia.

4. Usar sinais visuais e verbais

É útil selecionar louças que facilitem a visualização dos alimentos devido à cor ou à falta de padrões. Dependo das capacidades de linguagem que a pessoa preserva, pode ser importante dar instruções muito específicas, como ‘abrir a boca’, ‘mastigar’, ‘engolir’, fazendo perguntas diretas, simples e com poucas opções de escolha.

5. Modificar a dieta

Para além de tornar os alimentos mais fáceis de ver, pode ser necessário mudar a dieta com vista a facilitar a deglutição.

Rinki Desai alerta que, para algumas pessoas com disfagia, a textura de uma dieta ‘normal’ pode apresentar muitos riscos, tornando necessário, por exemplo, fazer alterações na textura ou consistência dos alimentos e dos líquidos de forma a reduzir o risco de engasgamento e outras complicações relacionadas com a disfagia.

No entanto, é importante manter a aparência de uma dieta normal para preservar o prazer da comida e ajudar as pessoas com dificuldades de perceção ou de memória a reconhecer os alimentos e sabores.

6. Consultar um médico sobre a alimentação por sonda e outras opções de alimentação. 

Um tubo de alimentação é um dispositivo médico projetado para fornecer nutrição a pessoas que não conseguem comer, engolir com segurança ou que precisam de nutrição suplementar.

Pode ser importante a sua colocação em pessoas com demência e disfagia se internados temporariamente por episódios de doença aguda ou incidentes de asfixia.

Porém, para cuidadores de pessoas em estádios avançados de demência, a colocação de um tubo de alimentação é uma decisão complexa. Alguns médicos podem recomendar a alimentação por sonda quando o quadro de demência progride para estádios avançados e a disfagia se torna grave. No entanto, estudos  têm demonstrado que a alimentação por sonda não melhora a qualidade de vida de pessoas com demência avançada. De acordo com Desai, em estádios avançados de demência, a alimentação por sonda não prolonga a duração da vida, não previne a pneumonia por aspiração e aumenta o risco de aparecimento de problemas de saúde adicionais, nomeadamente infeções, pelo que os benefícios que aporta podem não compensar os custos.

É, portanto, fundamental que as pessoas com diagnóstico de demência e seus cuidadores discutam as opções de alimentação com seus médicos no início do percurso da doença para tomarem uma decisão informada.

7. Fazer terapias de reabilitação para disfagia.

Existem  estudos que demonstram que certos  exercícios de fortalecimento da língua e outras terapias de reabilitação para disfagia ajudam as pessoas com demência a melhorar a função sensorial, a capacidade de mastigação, a segurança e a eficiência na deglutição.  

Ainda assim, Nicole Rogus-Pulia, Terapeuta da Fala e Professora Assistente no Departamento de Medicina da Universidade de Wisconsin, reconhece haver uma escassez de pesquisas sobre terapias eficazes na área da disfagia para as pessoas com demência.

Presentemente, conduz um ensaio clínico para estudar a eficácia de duas intervenções. Uma inclui colocar uma pequena lâmpada de pressão na língua, que as pessoas com demência podem empurrar contra o céu da boca repetidamente. Com este dispositivo, os médicos conseguem examinar a pressão exercida e criar alvos para as pessoas com demência trabalharem. Outra intervenção, também a ver a com a utilização de um gel substituto da saliva, que pode aumentar a lubrificação na boca, reduzir o esforço necessário ao engolir e, potencialmente, melhorar a saúde oral da pessoa com demência. Com estas intervenções, estima-se um desacelerar do declínio da capacidade de engolir das pessoas com demência e o aumento das reservas musculares, evitando assim os impactos potenciais da disfagia e melhorar a qualidade de vida da pessoa com demência.

Em conclusão, os cuidadores de pessoas com demência e disfagia devem consultar terapeutas da fala e médicos para analisar as melhores e mais seguras opções para lidar com a disfagia, nutrição e hidratação dos seus entes queridos. Deve ser tida em consideração a gravidade da doença, mas também aquilo que a pessoa com demência desejaria para si se pudesse participar na tomada de decisão. Independentemente do diagnóstico, qualquer pessoa merece “jantar com dignidade”.

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